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Lino passou a vida construindo memórias, teve muitas bifurcações em sua vida, prosperou, quebrou, recomeçou do zero, viveu intensamente cada dia que Deus lhe deu. Foi um homem de valor, lutador, buscou aprender com seus erros, superou limites, não teve medo de dividir o que sabia com aqueles que necessitavam de um apoio. Muitas vezes sacrificou o tempo de lazer para ajudar a pessoas que jamais vira e isso lhe trouxe bons frutos.

Das quedas Lino sempre tirou o melhor, dizia que a cada queda sentia o desejo de voar mais longe e costumava dizer que as desilusões são um remédio amargo, mas que as vezes eram necessários para que o paciente pudesse sarar.

Lino gostava de contar que certa vez havia chegado ao fundo do poço, sabe daqueles momentos em que você se vê prestes a entregar as pontas e sucumbir à depressão? Lino costumava dizer que nesses momentos sua mente fervilhava em busca de um atalho. Confiava fortemente em Deus e sabia que ele nunca deixaria faltar o pão de cada dia para sua família. Lino dizia que em uma dessas quedas, se viu diante da memória das palavras de seu querido mestre, Mauro, que o considerava como um filho e que quando Lino havia desistido de fazer o mestrado para montar parceria com uma empresa grande, o havia alertado que tivesse cautela, pois essas empresas grandes não são mais do que lobos disfarçados de ovelhas, interessados muito mais no potencial do trabalhador do que 

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Lino levou os pais para morar no litoral e sua irmã e seu cunhado os iam visitar uma vez por ano, assim o tempo passou e Lino nunca mais retornou à sua cidade natal. Os negócios prosperaram, Lino ganhou cada vez mais destaque no mundo digital. Na universidade encabeçou projetos de abertura de intercâmbios entre Brasil e África aplicados à melhoria das condições de qualificação profissional de alunos angolanos e acabou conseguindo recurso para montar um instituto de formação em engenharia cartográfica digital na Angola, com a ajuda de Domingos Cardoso, um velho amigo que conquistara por meio da audiência de seu canal no Youtube.

Lino passou um longo período em ponte aérea entre os dois países e acabou contribuindo em obras viárias na Angola e no Congo, onde deixou um legado muito grande em termos de amigos e frentes de trabalho, dos quais fazia questão de destinar um percentual para ação social naquele país.

Atingir solo Africano levando acesso ao conhecimento foi um dos grandes feitos da vida de Lino, que dizia de quem o havia visto vendendo sorvetes nos jogos de futebol da pequena cidade jamais apostaria que ele chegaria a pôr o pé fora da cidade, quem imaginaria ele atravessando o oceano?

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Vinte anos haviam transcorrido desde a última vez que Lino ficara frente a frente com Cida. Evidentemente ele jamais havia deixado a mente e o coração de Lino. Agora havia retornado à sua terra natal e sabia que em uma cidade pequenina o destino, o a probabilidade os faria um dia se reencontrar. Certo dia passeando com seu Filho menor, o pequeno Vítor, viu ao longe um rosto conhecido atendendo em uma loja de roupas no centro da cidade. Era impressionante como o tempo não havia passado para ela, era como se Lino tivesse entrado em uma máquina do tempo e voltado aos tempos de colégio.

Lino sentiu-se como novamente nas chácaras dos poncãs, sem ação. Não sabia qual seria a reação adequada, sua mente continuava trabalhando a mil quilômetros por hora, pensou consigo, se eu a cumprimentar e ela simplesmente me ignorar? E se eu fingir que não a vi e ela achar que tenho alguma mágoa do passado, coisa que se orgulhava em dizer para si mesmo que não sentia, pois a tempos havia chegado à conclusão de que cada evento que ocorreu nessa história foi um importante tijolo na construção de sua trajetória.

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Nem bem o ônibus havia iniciado o percurso, no rádio começou a tocar a música que ajudou Lino a superar aquela tenebrosa dor de cotovelo. Na rádio local tocava um dos maiores sucessos de Chico Rey e Paraná, chamada “Um degrau na escada” cujo refrão dizia: “ainda estou sentindo falta de você, eu sei que não tem jeito não tem nada a ver... eu tenho simplesmente que seguir, a minha estrada... quem sabe eu ache alguém para me fazer feliz... e que me queira bem.

Essa música era tudo o que ele queria dizer para Cida, o sentimento de revolta expresso na constatação de que havia sido um degrau na escada, como dizia música, era amenizado pelo sentimento que ainda sentia falta dela. A desesperança expressa no refrão onde no trecho seguinte o cantor eleva o tom da música dizendo: “o sonho disse não...” o que prevaleceu no final foi a constatação de que tinha que seguir em frente, quem sabe achasse alguém para lhe fazer feliz... que quisesse tudo o que não ela não quis, embora não a pudesse culpar, afinal o que tinha ele a oferecer... nada... Lino ainda não era ninguém. Tinha fé que um dia seria, mas quando conseguisse sabia que já seria tarde. Essa luta já estava perdida.

Lino sentiu-se derrotado, viu anos de expectativa se transformarem em frustação. Tentou sentir raiva, mas não pode... afinal Cida havia sido sincera em suas palavras, nunca lhe prometeu nada, nunca lhe deu esperanças reais. O grande problema é que na mente inventiva de Lino ele havia vivido sozinho dentro de seu mundo de fantasias uma vida inteira com ela, tão intensa quanto poderia ter sido se fosse real.

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Naquele momento Lino descobriu que em quatro anos muitas mudanças ocorrem. O menino tímido pode virar um ator. A menina Linda pode se tornar ainda mais linda e cativante, uma casa que ali existia pode não mais existir. Assim Lino com os olhos cheios de lágrimas praguejou contra o vento pois havia pedalado sem motivo, vindo de tão longe para descobrir que onde havia antes a casa cor de rosa de sua amada, agora existia apenas o piso vermelho de chão lustrado, que agora jazia fosco, ressequido pelo sol, chuva e poeira.

Lino deitou-se sobre o piso de um dos cômodos que imaginou ser o antigo quarto de sua amada e olhou para o céu na busca de uma resposta. Para onde teria se mudado sua amada? Afinal não dava para sair de porta em porta perguntando por ela. Nessa época, muitos anos antes de se pensarem em redes sociais ninguém atualizava status.

Lino ficou ali por horas, meditando sobre a história dos dois. Era muita falta de sorte que no dia em que ele resolve tomar uma atitude e olhar nos olhos de Cida e dizer com toda a sinceridade que ainda a amava o destino o tivesse pregado uma peça cruel dessas. Sentiu raiva, desgosto sentiu vontade de praguejar, mas ajoelhou-se naquele piso e simplesmente pediu um sinal. Pediu para que se fosse para ele continuar perseguindo esse amor que Deus o levasse até ela. O mundo era grande, mas acreditava na força do amor e sabia que Deus o guiaria, se fosse para ser.

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O tempo passava e o amor de Lino por Cida ficava cada vez mais intenso. Seu consolo era poder vê-la todos os dias, mas ao mesmo tempo não conseguia obter uma resposta de suas cartas. Escrevera quase 10 cartas desde que a conhecera e nisso já se foram dois anos. Lino não perdia a esperança e a cada coincidência, encontro acidental, sorriso discreto, tudo renovava as forças do garoto que fantasiava, sonhando acordado com o dia em que seguraria a mão da linda garota do pomar dos poncãs e anunciaria a todos que riam de seu amor, que ela era sua namorada.

Muitas foram as coincidências que motivaram Lino a continuar sonhando com esse amor. A primeira delas ocorreu logo no início do ano de 1998, quando na primeira semana de aula eram distribuídos os livros didáticos, geralmente adotados da turma anterior. A professora de matemática trouxe uma caixa grande com os livros que eram da sexta série do ano anterior e distribuiu aleatoriamente os livros pelas filas de carteiras e para surpresa, quando leu o nome do dono anterior, lá estava o nome de sua amada. Qual a probabilidade, pensou ele? Bem alta na verdade, mas Lino nunca acreditara em acasos. Aquilo só podia ser a vontade divina.

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